Extratos do texto "Arte, disciplina, vontade", do CD que integra o treinamento 'A Arte da Guerra Oriental'
"(...) O caminho da espada é o ensinamento moral dos samurais, incentivado pela filosofia confucionista, que moldou o sistema da era Tokugawa e pelo xintoísmo, religião natuva do japão. Os tribunais de guerra do japão do período Kamakura ao período Muramachi encorajavam o austero estudo Zen entre os samurais, que era intimamente ligado às artes da guerra. No Zen não há elaborações; ele visa diretamente a verdadeira natureza das coisas. Não existem cerimônias nem ensinamentos: a recompensa Zen é essencialmente pessoal. Iluminação, no Zen, não significa estritamente uma mudança no comportamento, mas sim uma percepçào profunda da natureza da vida comum. O ponto final é o começo e a grande virtude é a simplicidade.
Dessa forma podemos compreender como as etapas para obter a maestria em qualquer habilidade - incompetência inconsciente (sequer sei que não possuo tal habilidade ou conhecimento), incompetência consciente (sei que não possuo tal habilidade ou conhecimento), competência inconsciente (sei que possuo tal habilidade e conhecimento) e finalmente competência inconsciente (não sei explicar como, mas simplesmente possuo tal habilidade e conhecimento, ela faz parte de mim - nível de maestria) - já estavam imersas no cotidiano desses guerreiros há mil anos, considerando o período Kamakura, iniciado em 1185.
(...)
O ensinamento secreto da escola Kendo Itto Ryu, Kiriotoshi, é a primeira entre cento e poucas técnicas. É o ensinamento conhecido como "Ai Uchi", que significa golpear o oponente na hora em que ele golpeia você. É a alocação perfeita de tempo, é a ausência de ira. Significa tratar o inimigo como um 'convidado de honra'. deixando que ele tome a iniciativa. Significa também abandonar a própria vida ou, menos metaforicamente, abandonar o medo.
É a isso que chamamos "senso de oportunidade", a noção tão reta e "natural" de executar uma ação que é quase como se ela não fosse executada, mas apenas seus efeitos se encaixam no contexto modificando a confluência de forças em movimento em prol do seu objetivo e não do objetivo do oponente. O objetivo do oponente não é sequer considerado, apenas o fato de que o nosso objetivo ocorrerá primeiro e de forma mais natural, fluídica e poderosa.
(...)
A primeira técnica é a última, o iniciante e o mestre comportam-se do mesmo jeito. O conhecimento é um círculo completo. O primeiro capítulo da obra de Miyamoto Musashi, o "Livro das Cinco Esferas" ou Livro dos Cinco Anéis, é a Terra, como base do Kendô e do Zen, e o último livro é o Vazio, que é a compreensào, que só pode ser expressa como o 'nada'.
A princípio isso pode parecer complexo e pouco prático, não? Bem, eu o convidaria a pegar um carro e dar uma volta pensando nisso. Se você fosse capaz de dar a volta no quarteirão pelo menos, só pensando exclusivamente nessa frase acima, é uma indicação de que você já compreendeu o ensinamento sobre a Terra e o Vazio. Afinal, dirigir é uma habilidade prática (terra), que você introjetou a ponto de executar com maestria suficiente para poder deixar sua mente livre (Vazio) para pensar em outra coisa enquanto executa aquela habilidade. Maestria é isso e um pouco mais. É essa habilidade funcional primária que se torna uma maestria- uma segunda natureza - e, simultaneamente, é também uma habilidade em que você se torna pleno de potencialidades, o espaço do improviso, da sublimaçào da técnica, do 'vazio' como espaço pleno de potencialidades criativas e ações naturais orientadas pela técnica, que já não é técnica e passa a integrar a nós mesmos como um todo íntegro.
Os ensinamentos do Kendô são como os ferozes ataques verbais a que o estudante zen deve se sujeitar. Assaltado pela dúvida e pela dor, com a mente e o espírito tumultuados, o estudante é gradualmente conduzido pelo mestre à percepçào e à compreensão. O estudante de Kendô pratica furiosamente milhares de golpes dia e noite, aprendendo técnicas violentas de horríveis combates, até a espada tornar-se 'não-espada' e a intenção tornar-se 'não-intenção', simplesmente conhecimentos espontâneos de todas as situações.
É essa a essência de qualquer treinamento, aprender, tornar uma habilidade ou conhecimento 'naturais', 'inerentes', 'parte integrada' da pessoa. É essa a essência dos treinamentos ATENA"
Renato Kress
Diretor do Instituto ATENA
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