Eu sou aquilo que vai
Se o Renato de uma década atrás encontrasse o Renato de agora provavelmente teria um susto. Em muitos aspectos sou muito menos do que esperava ser aos vinte e oito anos e em outros aspectos sou muito mais. Há sempre uma construção nossa, uma perspectiva de que iremos desenvolver determinados projetos, faremos determinadas idéias se materializarem em nossas trajetórias, movimentaremos essa ou aquela idéia, nos casaremos, teremos mais tempo para isso, menos para aquilo...
Estamos continuamente nos criando e recriando, lentamente adquirindo e descartando pequenas partes de pertencimento, transformando essência intrínseca em anuência extrínseca e vice versa. Viver é recriar-se e recriar-se é definir o que queremos que nos acompanhe de agora em diante e o que dispensamos, aquilo que "já deu o que tinha que dar", que já "perdeu o sentido". Determinados relacionamentos, profissionais, afetivos, pessoais, sociais, são necessários para que aprendamos essa ou aquela maneira de encararmos o mundo, de vivermos essa ou aquela experiência específica. É assim que - os que observam e refletem - adquirem experiência.
Para quem não está de olhos bem abertos é possível viver toda uma experiência humana, toda uma vida, acumulando um mínimo de aprendizado e maturidade. É possível e mesmo esperado, dentro da cultura de medo em que somos submersos pela mídia contemporânea: medo de não pertencer, de não ser bom o suficiente, de não ser "líder", pró-ativo, reativo, agressivo, bem sucedido etc. Mas será que vale a pena?
Tempo Forte, tempo de criação
Começo a observar essas possibilidades e trabalhar com a idéia de "tempo forte" do romeno Mircea Eliade, um historiador romeno das religiões. Segundo ele no "tempo forte" é que todas as realidades são criadas, estruturadas, e é a partir do "tempo forte" que nós dotamos a vida de sentido.
Quando sofremos uma perda grande em nossas vidas, seja uma pessoa querida, uma grande verdade na qual nos alicerçávamos ou uma determinada situação que julgávamos como "resolvida", reestruturamos os valores pelos quais pautamos nossas vidas. Quando percebemos que nossa lógica de pensamento e ação não está seguindo por um caminho que nos satisfaça às aspirações, repensamos as linhas mestras que nos levaram até ali. É então que o "tempo forte" se manifesta. Através de uma grande dor interna que desencadeia uma grande quantidade de energia, com um potencial absurdo para a mudança. É aí, nesse instante que reside "o tempo forte".
O Bardo, tempo de oportunidade
O budismo tibetano possui um conceito denominado "bardo" que o monge Sogyal Rimpoche explica no seu Livro Tibetano do Viver e do Morrer da seguinte forma:
"Os bardos são oportunidades particularmente poderosas para a liberação porque são, segundo nos mostram os ensinamentos, certos momentos muito mais poderosos que outros, e muito mais carregados de potencial; tudo o que se faz neles tem um efeito crucial e de longo alcance. Penso num bardo como num momento em que se marcha para a beira de um precipício; tal momento, por exemplo, ocorre quando um mestre introduz um discípulo à natureza essencial, original e mais profunda da mente..."
A Jornada do Herói e o "Mergulho nas Trevas"
Dentro do curso A Jornada do Herói, criado e patenteado pelo Instituto ATENA, temos uma técnica denominada "katábasis" que é justamente essa idéia de, dentro de um ambiente sob controle do aluno e dentro de suas capacidades e perspectivas, operar a criação de um "tempo forte", de um "bardo", no qual teremos a oportunidade de desenvolver as mudanças necessárias a que levemos a vida que desejamos levar.
É um momento em que agradecemos aos nossos "grandes opositores" aos nossos "inimigos internos" por todas as suas intenções positivas, aceitando o que nos cabe e descartando o que não mais condiz com a nossa fase da vida. É a oportunidade de agradecer aos aprendizados, tomar consciência de nós mesmos e deixarmos morrer tudo aquilo que "já não mais nos pertence" mas que por alguma desatenção interna carregávamos como fardos desnecessários, quando algumas grandes verdades da infância ou adolescência podem ser repensadas e reestruturadas.
É sinceramente prazeroso ver muitos heróis, cada qual em sua jornada, se desfazendo de grandes verdades que já não lhes cabem hoje em dia, sempre mantendo a intenção positiva de "proteção", "respeito e cuidado para consigo mesmo", e outras que vierem a ser percebidas e reestruturando essas intenções positivas com o conhecimento que possuem de hoje. Porque o Renato de dez anos atrás não saberia lidar com os desafios que motivam o Renato de agora.
A arte do mergulho interior, a Katábasis
A Katábasis é uma técnica desenvolvida misturando programação neurolingüística, estados alterados da consciência, hipnose, xamanismo e estudos antropológicos acerca de estados iniciatórios e "tempos fortes" de diversas culturas e narrativas mitológicas mundiais. Uma técnica criada e patenteada exclusivamente para ser ministrada no curso A Jornada do Herói.
Por que mergulhar?
Como já foi dito antes é perfeitamente possível viver toda a vida sem repensarmos nossas atitudes e perspectivas em relação a nós mesmos. Sem reestruturarmos nossas certezas, nossas crenças, nossas perspectivas e vivências. Mas viver a vida assim, carregando as certezas de uma infância, de uma adolescência até mesmo do início da idade adulta, é corrermos o risco de nunca assumirmos a responsabilidade sobre nossas crenças, sobre nossas ações no mundo. É uma vida infantil e sem mérito. Assumir uma postura no trabalho porque uma revista ditou a nova moda gerencial, tratar meu filhos assim ou assado porque o meu pai tratava, agir dessa ou daquela forma porque "assim me foi passado". As tradições e as formas de levarmos a vida estão aí para serem conhecidas, nunca para substituir nossa autonomia e responsabilidade sobre nossos atos, escolhas e muito menos sobre a vida que levamos. Que eu conte histórias para meus filhos porque meu pai contava histórias para mim, claro, mas que eu escolha contar conscientemente cada uma delas, que seja parte de mim, escolhas responsáveis e conscientes, para que o mérito dele ou do avô do avô dele (quando criou essa "tradição familiar") não seja deixado para trás. Do contrário a própria "tradição" perde o seu sentido.
"Se nos recusarmos a aceitar a morte agora, enquanto ainda estamos vivos, pagaremos caros por isso no correr de nossas vidas, no momento da morte e depois dela. Os efeitos dessa recusa vão arruinar essa vida, e todas as outras que virão. Não seremos capazes de viver nossas vidas plenamente; ficaremos aprisionados no exato aspecto de nós mesmos que deve morrer. Essa ignorância nos despojará do elemento principal na nossa jornada para a iluminação, capturando-nos para sempre no reino da ilusão..." - Sogyal Rimpoche, O Livro Tibetano do Viver e do Morrer.
Mergulhar na Katábasis é reduzir ao mínimo denominador comum. Que, em linguagem da programação neurolingüística, é sempre reduzir à intenção positiva. A Katábasis é a forma de encontrar o alicerce dessa intenção positiva e ser responsável pelo que a partir dela será criado. É um primeiro passo para sermos os protagonistas de nossas próprias histórias.
Artigo por:
Renato Kress
Diretor do
Instituto ATENA
Criador do curso
A Jornada do Herói